10 dezembro 2011

Querer


O desejo dela era estar com ele o tempo inteiro. A vontade dele era de morar nela. Ele, que por muito tempo se perdeu dos seus desejos. Ela, a quem ele não dava nome. Que só existia entre quatro paredes, num amor que inventaram de ser proibido. Ele, que já não contava mais com o amor. Ela, que de tanto amar já não se achava capaz.
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Ela queria amar para sempre e para sempre ser amada, mas não buscava a promessa - não era ali que morava o para sempre. Ela o queria inteiro para si mesmo e tanto maior ao seu lado. Ela queria, não a promessa, mas a vontade. Ele queria, não a obrigação, mas a sorte. Eles queriam estar sempre começando de novo. Ela, que tinha uma história comprida, que vinha gastando no caminho. Ele, que há anos vinha arrastando o peso da sua. Muitas vezes ele pensava em desistir dela. E dela fugia. Mas era de si mesmo que ele fugia. E ela fugia dele, por pensar que por algum momento seu amor por ele era demais. Ele saía... Mas sempre voltava para casa.

Ela queria poder ser dele, mesmo não sendo. Queria então tomá-lo pela mão e desenharem juntos os caminhos a dois. Sempre cada um. Sempre de mãos dadas. Com a suavidade de não fazer tudo sempre igual. Ela queria a solidão dele, queria dividir com ele o seu sem rumo. Ela o queria quase toda noite. Queria cuidar dele enquanto ele estivesse hospedado nela. Queria hospedar-se nele também e, ali, naquele espaço de tempo, receber seus cuidados.

Ela queria uma filha com ele, como se precisasse fazer o amor virar carne, existir, ganhar o mundo. Queria que ele a quisesse tomar para si. Queria que ele sempre fosse bem-vindo, como queria ser bem-vinda sempre. De vez em quando ela também ia se hospedar nele, mesmo que por um tempo, com a certeza de que a casa nunca seria sua. Ela queria aquele amor macio e estranho, sem garantias de ser para sempre. Ela queria aquele amor de hoje. Queria amar com liberdade, embora desejasse o desejo de pertencer. A vida em volta continuava a mesma, embora ele sempre voltasse. Eram amigos. Disso, tinham certeza. Ele queria morar nela, mas tinha medo de ali ficar. Ela queria, sim, a sua presença. Ali, ele seria sempre bem-vindo. Mas o desejo dela não era o de engolir. Ela não o queria para si, embora o quisesse.

Ele não se reconhecia nela. Mas só se achava ali. Nela. Ali ele fazia suas confissões. Do que lhe metia medo, das mentiras que a vida lhe fez, dos desejos que nem teve. Ele queria adormecer nela. Mesmo que no dia seguinte saísse ao encontro de sua vida de sempre. Ele sempre voltava para ela. Ela, que a cada noite lhe contava uma história. E era sempre a história dele que contava. Ele gostava de ouvir sua própria história. Mesmo saindo dali assustado e com medo, muitas vezes. Havia muitos e muitos anos que ele evitava o espelho. Mas o dia chegava ao fim e ele voltava. Para ouvir mais uma história. Para se ver mais um pouco. Havia naquelas histórias alguma coisa que o atraía. Algo que o intrigava.
Por.Cristina Guerra

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