29 setembro 2013

The Voice

O dia passou tranquilo e enfim o tão esperado final de semana chegará. O vento soprava tão lentamente que sequer tinha forças para inclinar as pequenas partículas de água que insistiam em querer cair e estragar a tão esperada noite de sexta-feira. Mas isso de maneira alguma, atrapalharia seus planos. Nem chuva, nem frio, nem nada. Embora detestasse esse clima, por dentro, um jardim havia florido, antes mesmo da primavera chegar.  Ardia em seu peito uma chama tão descontrolada, que se houvessem olhos no Astro Rei, certamente morreria de inveja ao vê-la ofuscar maior calor do que si próprio, nomeado até então, a maior Estrela. Entrou em casa, atirou as chaves sobre a mesa, a bolsa no sofá (como de costume), e clicou acima do led da secretária eletrônica que acusava 4 mensagens. Foi tirando a roupa e seguindo para o banho enquanto as escutava.

1º Mensagem: Tentei ligar no seu cel, mas a operadora informou "fora da área de cobertura", liguei sei lá quantas vezes no escritório e nada, agora ligo aqui e cai na caixa, aonde se meteu? Me liga! (era seu irmão, pelo desespero, de certo iria pedir pra que ela fizesse algum trabalho de faculdade, perderá as contas de quantos TCC's fez pra ele, retornaria no domingo, não queria arrumar compromissos que a fizessem ficar em casa.)

2º Mensagem: Meninaaaaaaaaaaaa, tudo certo pra hoje à noite? Tô indo pra casa, nos encontramos no barzinho. Beijos "Miga". (soltou uma risada ao ouvir o "miga", detestava esse diminutivo chulo que passou das redes sociais para o vocabulário pessoal do povo, e sabia que a suposta, havia dito de propósito, por saber que ela detestava.)

Apanhou o roupão e enquanto esperava as duas últimas mensagens para seguir pro banho, apanhou um café. Acendeu um cigarro e voltou para a sala. 1 minuto passou e curiosamente a terceira mensagem não dizia nada. Franziu o cenho e quando estava se aproximando pra pular a mensagem, a quarta mensagem entrou. Deu um passo para trás e sua curiosidade aguçou quando uma voz desconhecida começou a falar...

4º Mensagem: Oi... (uma pausa não muito longa) Eu não sei por onde começar mas... (uma pausa maior, seguida da tentativa frustrada em abafar a respiração que ofegava) Você não sabe quem sou, na verdade talvez já tenha me visto, só nunca nos falamos de fato. Te vi algumas vezes num barzinho. (um sorriso leve cortou a frase e desta vez a respiração acelerada alternou um pouco o tom que nitidamente não parecia nada tranquilo) Você deve estar se perguntando como foi que consegui seu telefone, então adianto-lhe que foi uma mocinha muito simpática que me passou, alias, ela me pediu pra não contar que foi ela, mas fiquei receoso e com certo medo de pensar que sou um maníaco psicopata. Inclusive ela me garantiu que não teria problemas em te ligar, até liguei antes, mas por não saber o que falar desliguei. Enfim, acho que estou falando demais agora e isso deve estar te deixando se não apavorada, muito curiosa. Espero que seja a segunda opção. Estarei no barzinho por volta das 23:00 e espero encontrá-la por lá hoje. Então... me daria o prazer de sua companhia? (outra pausa) Até lá.

Tudo à sua volta desapareceu, focou em cada pequeno ruído, como conseguirá seu número já sabia, (filha da puta, como passou meu telefone assim? Mataria a "miga" mais tarde) tentou reprojetar as noites no barzinho para tentar visualizar o suposto admirador, mas nada... Não conseguiu lembrar de nenhum olhar mais fixo nela, ou ninguém que tivesse deixado pistas de querer conhecê-la melhor. A voz rouca e centrada, embora meio tremula não lhe era familiar, começou a projetar uma face para aquela voz mas logo sacudiu a cabeça e muito intrigada seguiu ao banho. Agora é que não deixaria de ir ao barzinho por hipótese alguma. Assim que terminou o banho, foi ao guarda-roupas e o abriu. A primeira ideia era calça jeans, e uma blusinha qualquer, mas agora as coisas haviam mudado um pouco. Era de sua natureza chamar a atenção, gostava de valorizar suas curvas, marcar bem seus olhos para ressaltar seu olhar extremamente misterioso e sedutor, mas mediante a nova situação, sentiu-se perdida. Ele sabia quem era ela, mas ela não fazia ideia de quem seria ele. Optou pelo jeans casual (que já tinha em mente) e uma blusinha branca com uma fenda belíssima em V que acentuava ainda mais seu colo. Trocou-se e colocou-se diante do espelho para a ultima avaliação antes de passar o perfume. O espelho a reprovou. O decote... Estava lindo, mas passou pela sua cabeça, que poderia estar passando uma imagem vulgar logo no primeiro encontro, embora ela não fosse nada vulgar. Tirou aquela e colocou uma mais fechada, estava frio, então também apanhou um jaqueta e um cachecol. Colocou-se mais uma vez diante do espelho e sorrio. Aprovado! Apanhou as chaves e saiu.

No caminho foi imaginando milhares de coisas, mas nenhuma delas tinham nexo. Sorria, sacudia a cabeça, ia trocando as estações do rádio. Cantava junto com as músicas, ora e outra errava um refrão bastante conhecido, pudera... estava ansiosa, curiosa, aflita demais. Detestava esse tipo de situação, alias, esta era uma situação nova pra ela. Estava na porta do bar, a fila pra entrar estava enorme. Do carro ligou para amiga e pra sua surpresa, ela não viria. Seu pai havia passado mal e ela estava no hospital com ele. Adiantou-lhe por cima que havia dado seu telefone para uma pessoa, mas quando ia dar maiores detalhes, precisou interromper a ligação. Pronto. Agora ela estava além de curiosa, NERVOSA. E com uma vontade enorme de socar a amiga da onça que a colocará nessa sinuca de bico. Respirou o mais fundo que pode, tomou coragem, entrou na fila. As pessoas falavam sem parar, o som de dentro da casa ecoava pelo quarteirão todo, havia uma variedade enorme de etnias, estilos, pessoas. Cada um com um sotaque ou uma gíria diferente e o mais curioso é que ninguém parecia se importar com quaisquer diferenças entre eles. Estavam todos a espera de entrar num mesmo lugar e curtir a noite, sem se importarem com gêneros, números ou graus. Ela adorava aquele lugar, há algum tempo não o frequentava por diversos motivos, enfim... Estava arrumando isso. Não tinha mais porque's de não estar ali, de não curtir, de não se curtir. Por fim, chegará a sua vez, até chegar a porta, tinha esquecido o nervosismo que agora, voltara a acelerar seu coração que por sua vez, parecia comprimir seus pulmões e não deixar o ar entrar.

"Vamos menina"... disse a si mesma. "Até parece que não sabe lidar com uma situação dessa!" Se permitiu sorrir de leve e caminhou em direção ao balcão. Acenou ao garçom (já seu conhecido) e ele prontamente consentiu com a cabeça e sem que ela precisasse pedir, já veio até ela com seu pedido. (coca-cola e fritas, era sempre o mesmo) Quando seguia para seu cantinho favorito (a mesa próxima ao palco), notou que seu lugar já estava ocupado. Torceu o bico apertando os olhos mirados ao intruso que atrevidamente tomará seu lugar, mas antes que se direcionasse a mesa ao lado o viu acenar. Não pra ela, ou pra ela? Ficou parada de pé o encarando por alguns segundos e ao vê-lo se levantar e apontar para cadeira ao lado, sentiu um frio percorrer-lhe a espinha. (caralho... era ele) Agora a feição de desaprovação, passará instantaneamente para timidez, sentiu-se como um gato acuado num beco escuro por um cão. Ele por sua vez, sorrio ao apagar o cigarro e caminhou em sua direção sorrindo, calmo e tranquilamente. (talvez estivesse mais nervoso que ela, e provavelmente estava. Mas com certeza, disfarçou bem melhor que ela) Posso te ajudar? Perguntou ele, estendendo a mão para apanhar a bandeja. Ela não disse uma única palavra mas esticou os braços de vagar para não se permitir tremer, entregando-lhe a bandeja. Ele deu um passo para trás, pra que ela seguisse na sua frente, e enquanto caminhava para (sua) mesa dele mentalizava repetidamente... (controle, mantenha o controle).

Ele colocou o pedido dela no exato lugar em que estava sentado (o dela de fato), puxou a cadeira para que ela se sentasse e dando a volta na mesa, sentou-se do outro lado. Não levou mais de 10 segundos para que ele se sentasse a sua frente, mas o tempo daquele momento pareceu demorar uma década. Aquele sorriso, parecia tê-la hipnotizado. A maneira em que ele se movia, gesticulava, parecia querer aprisionar suas retinas. O perfume... Invadiu seus pulmões como uma bomba nuclear. Automaticamente, todos os seus sentidos foram postos em alerta. Ela não conseguia sequer falar... (coisa raríssima de acontecer, ainda mais com ela). Seus olhos pareciam um par de águas-vivas, seu nariz perfeitamente simétrico só perdia para os seus lábios. Cabelo castanho claro muito bem cortado, liso, despojado, mas a barba muito bem feita com um leve ar de por fazer, lhe dava um aspecto sério, maduro, centrado. Estava o encarando já alguns minutos, e só fez conta disso quando ele por sua vez, decidiu romper o silencio (entre eles).

Ele: - Você agora sabe quem sou, digo, como sou. (deu um leve sorriso) 
Sua amiga deve ter confirmado o que lhe disse não?
Ela: - Sim, ela confirmou sim...
Ele: - Sentei aqui, porque não queria que ficasse me procurando. 
E como todas às vezes em que à vi por aqui, estava nesta mesa, 
supus que seria seu lugar favorito (a encarou ao falar).
Ela: - Muito presunçoso de sua parte, achar que eu ficaria lhe procurando.  
(o tom que usou foi extremamente calculado, estava bastante nervosa e não queria transparecer)
Ele: (ele sorrio gostoso e largo) Talvez sim, mas se não estivesse curiosa em relação a mim, 
não teria vindo. Não hoje, certo?
Ela: (Agora quem sorriu gostoso foi ela) Certo! 
Fiquei mesmo curiosa, queria descobrir quem era 
o dono da voz misteriosa e o nome, se é que tem um, tem?
Ele: Tenho sim! Me chamo Henrique. 
(Ele estende a mão por cima da mesa, esperando então o cumprimento dela)
Ela: Prazer Henrique, me chamo Bell.

Depois de se apresentarem, ficaram horas conversando, dançaram algumas músicas juntos, voltaram a mesa, riram, trocaram informações. Ele relatará a ela o dia em que colocará os olhos nela pela primeira vez, e ela vagamente lembrou-se da cena. Ele quis saber o porque dela ter bebido tanto naquele dia, já que das outras vezes, não tomou nenhuma bebida alcoólica. Ela não queria falar naquele assunto, mas contou-lhe sem muitos detalhes o que havia acontecido naquele dia. Falaram sobre seus robes, sobre com que trabalhavam, o que gostavam de fazer nas horas vagas, enfim... Estavam se conhecendo, embora a sensação era de que já se conheciam a séculos. A noite estava chegando ao fim, ela precisava ir, mas toda vez que tentava se despedir, ele pedia para que ela ficasse mais um pouco, e com isso ela foi ficando, até que a manhã já parecia querer raiar do lado de fora. Já eram quase 5 AM, a casa já estava quase vazia, se não fosse por eles e os funcionários que limpavam toda a bagunça. Definitivamente era hora de ir. Para os dois...  Ele a levou até o carro, trocaram oficialmente seus números e marcaram de se encontrar outra vez. Se despediram com um beijo no rosto. E naquela manhã, ela chegou em casa e caiu na cama com um sorriso enorme no rosto. Como há muito não acontecia... Antes de ir se deitar, voltou a ouvir a mensagem, aquela voz de alguma maneira a fazia sentir-se diferente. E aquilo era bom. Jogou se na cama e as perguntas começaram a se misturarem diante de seus olhos, que se encontravam fechados, repassando cada instante que passou ao lado do misterioso Henri... Seria ele só mais um sapo disfarçado de príncipe encantado? Seria ele o Band-aid de seu coração tão surrado? Quem seria ele, além daqueles olhos que a encontraram num dia tão amargurado e o fizera desejá-la mesmo quando estava um trapo?Antes mesmo de concluir suas duvidas, adormeceu... E pela primeira vez em muito tempo, ao despertar, se pegou sorrindo.
Por. Bell.B


Um comentário:

Obrigada por partilhar comigo, o que você pensa!